terça-feira, 26 de abril de 2011

Mascando chiclete

Desde quando éramos molecotes arruaceiros, mamãe nunca permitiu que mascássemos chiclete; que disséssemos algum palavrão, vá lá, mas mascar chiclete - nunca! Seu argumento infalível era que, quando mascávamos chiclete, parecíamos jumentinhos mascando capim; além do mais, ela não suportava aquele barulhinho irritante de borracha que a mastigação produzia: nhéc, nhóc, nhéc, nhóc. Irritava-se logo e metia um safanão em  quem quer que estivesse mascando o detestavael chiclete em sua presença.
Receosos de que fôssemos pegos, mascávamos chiclete na rua, às escondidas. Éramos doze, ao todo, e juntos formávanos uma espécie de sociedade secreta - como os Cavaleiros da Távola Redonda, só que em maior número.
Nosso segredo só era revelado com a ida ao dentista. Ele, de lanterninha em punho, examinhava nossa boca cutucando nossa língua com um palito de picolé; fazia umas caretas que os médicos fazem quando descobrem que algo não vai bem e sentenciava :"Este gurio tem cáries". Mamãe nos lançava aquele olhar que conhecíamos tão bem.
Depois da consulta com o dentista, morríamos de medo de voltar para casa, pois sabíamos - ah, e como sabíamos! - que a maior surra de todas as nossas vidas nos estaria aguardando.
Porém não tomávamos jeito nunca. Mal nos curávamos das pancadas e beliscões que mamãe nos dava, estávamos reunidos novamenste para mascar o bom e velho chiclete.
E aos poucos nossa sociedade foi crescendo, agregando os novos garotos que chegavaam ao bairro, de modo que nos tornamos uma organização tão complexa, que nem mesmo mamãe (ou a polícia) era capaz de frear nossos atos ilícitos.

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